segunda-feira, 28 de abril de 2014


"Tudo começa com aspas. Só elas, digo-te de primeira, transcrevem a desordem de um coração que se esconde entre becos, dia e noite, com medo de apanhar pela simples ideia de amar em um mundo tão mecânico. E é assim que começa a nossa história: entre versos rabiscados, mesas de bares e folhas com as mais belas expressões desenhadas, uma vez que nunca permitiste que nosso amor fosse além de romances gravados em minha mente.
Talvez um dia, quando sentir na realidade a abstinência de tudo aquilo que cheguei a imaginar para nós, eu entenda porque é o teu rosto que enxergo quando fecho os olhos. Passei anos, meu bem, imaginando a fusão de dois corpos em um, brincando com palavras que traduziam teu nome e sentindo a mais amarga inveja das donzelas em cujos sonhos você insistia em aparecer. Conheci amores e desamores, mas nenhum com o teu sabor doce que trazia ao céu da minha boca uma porção de estrelas em forma de ansiedade, esperando avidamente por um único beijo. Tornei-te itinerante da minha própria ilusão.
Era servida dos mais fartos banquetes, das emoções mais variadas. Vivia à flor da pele, mas clamava, na verdade, por um jardim inteiro cercado de borboletas como no início da primavera. Como naquele outubro em que decidiste entrar de mansinho nas florestas do meu coração. A dor de não possuir-te só para mim era tanta, que só sabia que não havia perdido a cabeça por conta das longas noites de enxaqueca. Logo tu, que nunca foste fã do subliminar... Logo eu, que nunca fora a especialista em amores que cortam como navalhas.
Somente faltavam-me seus pés para completar a linda estrada que havia escrito para nós, mas insististe nessa baboseira de frações, quando tudo que queria era perder-me no labirinto dos seus braços, na ameaça de seus olhares... no teu inteiro. Juntos, transbordaríamos, e quem sabe, até, não nos tornaríamos perpétuos? Tudo o que cada célula de meu corpo pretendia era que aquelas três palavras tão belas fossem finalmente mastigadas como mel por seus lábios avermelhados.
A inquietude sempre fez com que quisesse o controle total de cada átomo em meu corpo. Preferi, desde sempre, então, o sofrimento na terra. Talvez por isso sempre tenha sido adepta a paixões avassaladoras. Mas de uns tempos pra cá, tornaste difícil a convivência perto de seus olhos tão tentadores. Punha-me a pensar, debaixo da chuva que lavava a alma, na ideia constante da amarração de duas mentes. A morte não seria sofrimento. Percebi: a vida real não é feita de poesia. Carrega consigo toda a imperfeição de demências alheias que não se encaixam em um 'eu e você'.  Meu coração transbordava. O que eu almejava era além da vida, uma vez que a fusão de duas almas só se dá pela morte. Não fomos, então decidi ser por todos aqueles que cobiçam corações postos em pedestais. Naquela noite de segunda feira tão monótona, fui, observando o céu tão denso, mas ainda sim iluminado pelo sorriso de algumas estrelas. Junte-se à Lua e ganhará o direito de ser livre."
Isadora Egler

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