segunda-feira, 16 de junho de 2014


"Não sei o que houve. Estações passam, a primavera traz consigo a melodia de pássaros que gorjeiam ao terem a face beijada pelo sol, mas algo parece errado. Há um pulo e logo nos encontramos presos no frio do inverno, capaz de congelar até mesmo a alma de um boêmio. O que houve, poeta? Sabe me dizer o que exatamente se passou no instante em que fechamos os olhos?
A utilidade que há em toda essa melação sobre seu versos tão incorretos, ainda não a encontrei. Talvez sirva para aquecer o vazio onde deveria haver um coração, em seu peito. Ambos sabemos que sua alma é como um buraco negro cujo interior nunca enxergaremos a aparência ao certo. Acerto o pulo quando digo que fechamos os olhos. Jamais saberemos como se perderam, entre o oceano infinito, nossas rimas engarrafadas de amor.
Lembra-se, poeta, de como passamos aquela noite? Relato que tudo começou na época ensolarada em que floreiam os campos, mas o céu negro que bordava as horas recém-nascidas da manhã eram gélidas. Haveria explicação para tal fenômeno? Ora, poderia sim dizer que fizemos nossa própria primavera. Sabe por que, ex-amado? Não tínhamos medo e nem carregávamos, nessa viagem, uma bagagem de expectativas. À priori, talvez, mas as abandonamos no momento em que cruzamos olhares. O medo se fora. Já não importava mais se o tempo lá fora era outono, primavera, verão... A mudança era dentro de nossos corações.
Assumindo, então, que a fase era a do bater mais leve de asas das borboletas, época do desabrochamento de flores, que etapa melhor para o renascer de corações? Para, finalmente, como pássaros nascidos, arriscarmos o primeiro voo? Sabia que me daria base e confiança. Mas oh, querido... A queda fora tão bruta.
Durante os segundos torturantes que seguia o meu baque, por própria defesa, endureci meu coração. Contraí firmemente os músculos que controlariam a vontade de, novamente, amar. Como proteção. Obviamente, como boa curiosa, não fui ainda capaz de abandonar meus anseios em descobrir por que raios doeu tanto. Aprendi, ao menos, que o inverno chega para todos.
Em meio a tanto frio e tremedeiras, tem coragem de colocar para fora suas garras e transpor em palavras que criei meu próprio silêncio, quando tudo o que sempre me fez foi calar-me a boca com suas mordaças de orgulho? A pergunta é retórica. Os fatos não mentem. Ou melhor, a poesia que eterniza. O poeta de um só coração se basta. Não seria capaz de escrever mais nada que não dissesse respeito ao seu viver.
O pior de tudo, talvez, seja ver suas mentiras suportadas por atores em um show de horrores. Há quem sustente a estrutura de seu espetáculo de autopromoção. Pergunto-me o porquê. Porquê esse, já tão acostumado a ser maltratado e jogado a uma pilha de outros questionamentos que nunca conhecerão respostas. O que mais me dói é saber por qual motivo escolhemos a primavera, poeta. O verão teria lhe levado embora como tantos outros amores repentinos. O outono teria se dado o trabalho de substituir tudo aquilo que já foi calor, cobrir seu lugar folhas, tão aconchegantes quanto e talvez até mais melancólicas que a de seus escritos. O inverno, vindo previamente, teria dado a mim tempo o suficiente para tecer mantos que cobrissem sua falta. Entretanto, 'nem sabia o nome das flores, e agora meu jardim já era". Espero que tenha deixado claro que até mesmo a mais delicada rosa coleciona gotas de sangue.
Isadora Egler

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